Como todas os setores da medicina, a neurociência
evoluiu bastante. Enquanto hoje temos procedimentos sofisticados de cirurgia
cerebral (que permitiram até que um brasileiro tocasse violão enquanto passava
por um procedimento), no passado as coisas eram bem diferentes. Um exemplo é a
trepanação.
E o que vem a ser isso? Explicamos: é a abertura de
um ou mais buracos no crânio. Seu registro mais antigo data de oito mil anos,
se tornando o mais velho procedimento cirúrgico conhecido - e, incrivelmente, a
técnica era usada por várias culturas antigas, desde civilizações
pré-colombianas até as primeiras civilizações europeias. Sabemos disso porque
vários crânios perfurados foram recuperados em sítios arqueológicos ao redor do
mundo - e, como você pode ver pela imagem acima, a perfuração da trepanação é bem
diferente da causada por outros traumas cranianos.
Acredita-se que a cirurgia era considerada a
solução para vários tipos de doenças. Além de ser usada para “tratar”
ferimentos cranianos e doenças mentais, arqueólogos sugerem que a trepanação
poderia ter propósitos religiosos - como o exorcismo.
Para fazer a perfuração, eram usadas pedras
pontudas e lâminas de obsidiana (nos primeiros registros). Depois, quando
humanos aprenderam a manipular metais, na era do bronze, bisturis e serras
primitivas foram usados. Algumas culturas até desenvolveram técnicas para fazer
a cirurgia com vidro!
No entanto, foi só em 400 a.C. que o grego
Hipócrates, considerado o pai da medicina, escreveu um tratado sobre o cérebro
e revelou mais detalhes sobre a trepanação.
De acordo com o neurocirurgião Graham Martin, em
uma publicação no Journal of Clinical
Neuroscience, Hipócrates nunca havia feito uma trepanação, mas havia
aprendido sobre a técnica em uma viagem para Marselha, onde o procedimento já
era feito há 1500 anos. Ele compreendeu que a técnica era usada para aliviar a
pressão no cérebro causada por sangue, "demônios", ou qualquer que
fosse o diagnóstico do médico.
Na civilização pré-colombiana dos zapotecas, no
entanto, temos uma situação bem diferente: a trepanação era usada várias vezes
- foram encontrados vários crânios com múltiplas perfurações. Acredita-se que
era um tratamento popular para dores de cabeça. Mas tudo isso é especulação -
não se sabe, por exemplo, se o procedimento era feito em voluntários. Afinal, ele
não deveria ser nada agradável.
No século XV, a trepanação foi mais documentada,
inclusive por pintores renascentistas - quadros mostravam que a cirurgia era
usada para curar, de forma sobrenatural, problemas mentais. Um deles era
chamado de “pedra da loucura”. A tal pedra precisava ser retirada do cérebro do
doente antes que 'contaminasse' o cérebro inteiro - e uma cena dessas foi
retratada por Hieronymus Bosch no quadro "A extração da pedra da loucura".
Como sabemos, o campo da neurocirurgia avançou
muito desde então, mas uma versão da trepanação ainda é usada na nossa medicina
em alguns casos, com um nome diferente e com técnicas mais avançadas. Chamada
de craniotomia, é um tratamento emergencial para frear hemorragias cerebrais.
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