O europeu moderno teve origem a partir da mistura,
ao longo dos últimos sete mil anos, de apenas três tribos da Antiguidade,
segundo um estudo publicado na revista "Nature". A principal miscigenação partiu do encontro de uma
tribo de caçadores de pele morena e olhos azuis com outra vinda do Oriente e
formada por fazendeiros de pele clara e olhos castanhos. Uma terceira tribo de
características siberianas também contribuiu para a formação da genética
europeia moderna. A pesquisa foi feita a partir da análise do genoma dos restos
de nove europeus que viveram na Antiguidade.
A agricultura surgiu no Oriente, em território hoje
formado pela Síria, o Iraque e Israel, antes de se expandir para a Europa há
cerca de sete mil e quinhentos anos. Evidências apontavam que este novo estilo
de vida havia se espalhado pelo continente com a chegada de imigrantes, que
tiveram filhos com integrantes de tribos europeias de caçadores com os quais
encontraram em seu caminho migratório. Mas as crenças sobre a origem europeia
tinham como base os padrões genéticos de pessoas vivas. A análise do DNA de
ossos antigos testou estas teorias e trouxe algumas surpresas.
O DNA contém instruções bioquímicas para a
construção do organismo humano e se encontra no núcleo de nossas células. No
novo estudo, David Reich e seus colegas da Escola de Medicina de Harvard
estudaram o genoma de sete caçadores da Escandinávia, de um outro caçador cujos
restos mortais foram encontrados em uma caverna em Luxemburgo e de um fazendeiro
de Stuttgart, na Alemanha. Os caçadores chegaram à Europa milhares de anos
antes do surgimento da agricultura, se abrigaram no sul do continente durante a
Era do Gelo e se espalharam no período conhecido como Mesolítico, depois que as
camadas de gelo derreteram no norte e no centro da Europa.
O genoma do grupo não corresponde ao de nenhuma
população moderna, o que indica que ele se perdeu com a evolução humana, na
transição para uma sociedade baseada na agricultura. No entanto, seus genes
sobrevivem no DNA de europeus modernos, principalmente naqueles que vivem no
norte e no leste do continente.
O genoma do fazendeiro de Stuttgart tinha um padrão
completamente diferente, compatível com o da população atual da ilha da
Sardenha, na Itália, e era bem diferente do genoma dos caçadores Antigos. Mas,
apesar dos fazendeiros da Antiguidade compartilharem algumas similaridades
genéticas com populações atuais do Oriente, também há diferenças
significativas.
Reich sugere que migrações mais recentes à
"terra natal" dos fazendeiros podem ter diluído seu material genético
nesta região.
Os genes responsáveis pela pigmentação dos olhos e
da pele de caçadores e fazendeiros mostra que, enquanto o cabelo escuro, os
olhos castanhos e a pele alva dos fazendeiros antigos não seria algo estranho
nos dias de hoje, os caçadores se destacariam na multidão. "Eles tinham uma combinação de pele escura e
olhos azuis que não existe mais nos dias de hoje", disse Reich à BBC.
Carles Lalueza-Fox, do Instituto de Biologia
Evolucionária em Barcelona, na Espanha, disse que a pesquisa contraria as
noções atuais destas populações antigas. "As reconstruções das populações mesolíticas sempre as mostraram com
pele alva. E os fazendeiros às vezes aparecem com pele escura. Esse estudo
mostra que era o contrário".
Então, de onde veio a pigmentação mais clara dos
europeus de hoje? Provavelmente os fazendeiros tinham um gene de pele mais
clara que persiste até hoje. "Existe
um argumento que diz que a pele clara é mais vantajosa para quem realiza
agricultura, porque estas pessoas precisam produzir vitamina D, enquanto os
caçadores conseguem esta vitamina de sua comida", diz Reich. "Uma vez que o caçador se torna agricultor,
ele não tem mais tanto acesso a esse tipo de vitamina, então, existe uma
seleção natural que 'clareia' a pele da população".
Quando os pesquisadores analisaram o DNA de 2345
pessoas dos dias de hoje, eles descobriram que uma terceira população
influenciou na complexidade genética dos europeus modernos. Essa tribo
"adicional" é a mais enigmática e, de forma surpreendente, tem relações
com os nativos da América. Pistas deste grupo surgiram na análise do genoma
europeu há dois anos. Chamados de "eurasianos do norte", este grupo
permaneceu como uma "população fantasma" até 2013, quando cientistas
publicaram o genoma de um garoto que viveu há vinte e quatro mil anos na
Sibéria.
Esse indivíduo tinha similaridades genéticas tanto
com europeus quanto com nativos americanos, o que sugere que ele fazia parte de
uma população que havia contribuído para a migração rumo ao Novo Mundo há quinze
mil anos e depois para a Europa. O caçador antigo de Luxemburgo e o fazendeiro
da Alemanha não exibem sinais de miscigenação com esta população, implicando
que este terceiro ancestral foi adicionado à mistura continental depois que a
agricultura já havia se estabelecido na Europa.
O estudo também revelou que os primeiros
fazendeiros e seus descendentes europeus têm como ancestrais uma linhagem
antiga conhecida "eurasianos basais". Este grupo representa a
primeira separação ocorrida entre os humanos que deixaram a África há sessenta
mil anos.
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